Colóquios dos simples, e drogas e coisas medicinais da Índia, obra de Garcia de Orta, publicada em Goa, há 450 anos
Imagem daqui.
Imagem daqui.
“Interessa aqui realçar a
importância de Garcia de Orta e da sua obra à luz do seu tempo e dos
Descobrimentos, uma época que, graças ao destacado contributo dos Portugueses,
deu a conhecer povos e lugares até então ignorados pelos europeus.
A descoberta de um mundo repleto de
novidades despertou os sentidos e a curiosidade, dando origem a uma produção
científica e intelectual sem precedentes na história da humanidade que alargou
horizontes, fez expandir o conhecimento e marcou a passagem para a modernidade.
Nascido em Castelo de Vide em 1500,
Garcia de Orta haveria de se formar em Artes, Filosofia Natural e Medicina nas
Universidades de Salamanca e de Alcalá de Henares, assimilando o saber e a
erudição do seu tempo. Foi essa erudição que, juntamente com a sua sede de
conhecimento, levou na bagagem ao embarcar para Goa em 1534.
O livro Colóquios dos simples, e
drogas e coisas medicinais da Índia, aquando da sua publicação em Goa em 1563,
apresentou a primeira descrição rigorosa feita por um europeu, da origem, das
características botânicas e das propriedades terapêuticas de várias plantas e
drogas medicinais, até ali desconhecidas ou erradamente descritas pela ciência
de então.
Mais do que o importante contributo
de Garcia de Orta para o desenvolvimento da Botânica, da Farmacologia, da
Medicina ou da Antropologia, importa salientar o papel pioneiro que assumiu
nessas áreas do saber, graças à sua independência de espírito e objetividade,
não hesitando em dar primazia à sua experiência empírica, face ao conhecimento
e à autoridade dos autores clássicos que estudou.
Garcia de Orta foi, acima de tudo,
um exemplo de prevalência da liberdade intelectual face ao saber preconcebido,
elemento que constitui a génese e o alicerce do método e conhecimento
científico. É essa prevalência da Razão que, ainda hoje, constitui o motor do
progresso e da evolução das civilizações.”
António Osório, in Agenda 2013, Lisboa, Imprensa
Nacional-Casa da Moeda, 2012.
Apresentam-se alguns excertos dos
Colóquios 26º - Do Gengibre, 53º - Do Tamarindo, 12º - De Duas Maneiras da
Camfora, e das Carambolas, e 13º - Do Cardamomo, e das Carandas, retirados da
obra Colóquios
dos simples, e drogas e coisas medicinais da Índia (semana 31):
“ORTA – (…) [o gengivre] nam o ha máo se o fazem em conserva (…); e he picado com
buracos para lhe entrar a agoa, e se lhe fazem isto muytos dias, e o fartam bem
de açucare, he muyto bom, e nam queima, nem leixa fios na boca. (…) Trazelha,
moça, á mostra.
“ORTA – (…) e fazem deste tamarindo
huma muyto graciosa conserva com açucare, e he feita delle fresco e sem sal. E
podeme crer que he hum digistivo e purgativo muyto bom, e muyto aprazivel ao
gosto. Moça, traze cá tamarindo em
conserva.
“ORTA – (…) muitas pessoas acham nellas muito sabor, em especial as que
chamamos agras doces, porque estas sam hum pouquo mais azedas; fazse dellas
huma conserva de açucare muito graciosa, que eu mando dar em lugar de xarope
acetoso (…). Antonia traze qua huma carambola
em conserva.
“ORTA – (…) Chamam-se carandas,
(…) estas verdes são salgadas, e esta provisam ha nesta terra, que fazem as
fruitas salgadas pera incitar o apetite no tempo que as nam ha; e tambem as
lançam em vinagre e azeite, a que chamam achar;
(…) E pois estes Indios buscam tantas maneiras á gulla, comei.”