Fotografia: Museu do Neo-Realismo |
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Campaniça
Valgato é terra ruim.Fica no fundo de um córrego, cercada de carrascais e sobreiros descarnados. O mais é terra amarela, nua até perder de vista. Não há cearas em volta. Há a charneca sem fim, que se alarga para todo o resto do mundo. E, no meio do descampado, no fundo do vale tolhido de solidão, fica a aldeia de Valgato debaixo de um céu parado.
Valgato é uma terra triste.
Saem os homens para o trabalho ainda a manhã vem do outro lado do mundo. Levam enxadas e foices e conhecem todos os trilhos, entre o mato, com estevas que são mais altas que duas vezes o tamanho do mais alto dos homens de Valgato. Tanto conhecem os caminhos que vão, sem desvio nem engano, até às herdades que ficam a léguas de distância, ainda com o sono e o escuro da noite fechando-lhes os olhos.
Não é de admirar. Zé Tarrinha tem uma mula que caiu num barranco de piteiras e vazou os dois olhos. Pois a mula nunca erra a casa e vai sozinha à fonte. Não é de admirar que os homens saiam ainda com o escuro da noite, e com o sono, e vão sem desvio ou engano até às herdades.
O Venta Larga, quando se fala que alguém se perdeu no caminho, diz sempre:
- A gente não precisa senão de saber onde põe os pés. O mais é cá disto ... - funga com ruído e, alargando as narinas, aponta o nariz - ... o mais é cá do cheiro.
Por isso lhe chamam o Venta Larga.
Manuel da Fonseca, Aldeia Nova (1942)
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