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Escola Secundária José Saramago - Mafra

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

PRESTE JOÃO DAS ÍNDIAS


O Preste João como rei dos reis. Ilustração do Wappenbuch de Conrad Grünenberg (Constância, 1480). Bayerische Staatsbibliothek, München.


"(...) Além das outras maravilhas da nossa terra, as quais parecem completamente incríveis aos homens, possuímos cinco pedras incrivelmente poderosas, do tamanho de avelãs. A natureza da primeira é tal, que, tanto no Inverno como no Verão, se a colocamos ao relento, ela irradia um frio tão intenso em dez milhas ao redor de si que, na verdade, nenhum homem nem nenhum animal o pode suportar pelo espaço de meio dia, que imediatamente não se resfrie e morra. A natureza da segunda pedra é tal, que, igualmente, tanto no Inverno como no Verão, se a colocamos ao sol, produz um tão grande e ardentíssimo calor, que nenhuma criatura vivente o pode suportar pelo espaço de meio dia, que, tal como a estopa arde no meio do fogo ardente, não se queime completamente e fique reduzida a cinzas. A terceira pedra está no meio, entre as outras duas. Não é fria nem quente, mas é fria e quente; em ambas as situações é temperada para modificar esta ou aquela intempérie cuja violência não poderá assim prejudicar ninguém. A quarta pedra é tal que, se a meio da noite, em grandes trevas, é colocada ao relento, ao seu redor, irradia uma tão grande luz e esplendor num circuito de dez milhas, que nada de tão subtil ou tão exíguo pode ser imaginado que não possa ser visto, como ao meio dia, com o sol brilhante luzindo. Mas a quinta pedra é tal que, se, ao meio dia, com sol ardente, é colocada ao ar livre, de modo semelhante, dez milhas ao seu redor produz trevas obscuras, de modo que nenhum mortal pode enxergar o que quer que seja, nem pode também saber ou calcular onde se encontra. Como ficou dito, estas pedras, se são colocadas ao ar livre, têm as virtudes sobreditas, mas se estiverem escondidas, não têm estas nem outras virtudes; pelo contrário, são tão desengraçadas que não parecem, de todo em todo, ter qualquer valor. (...)"

Carta do Preste João das Índias, versões medievais latinas, prefácio e notas de Manuel João Ramos, tradução de Leonor Buescu, seleção iconográfica Manuel João Ramos e Alexandra Campos, Lisboa, Assírio & Alvim, 1998, pp. 77-79.


Da Introdução:
"A enigmática figura do soberano indiano Presbiter Johannes apresenta nesta Carta pseudo-autográfica todo o esplendor do seu maravilhoso e inacessível império, cujas regiões orientais fazem fronteira com o próprio Paraíso terrestre. Em grande medida elaborado sobre dois modelos literários, o Romance de Alexandre e o Apocalipse segundo S. João, este texto latino medieval revela aos seus leitores um imperador ideal e cristomimético: como o Cristo apocalíptico, o Preste João é um intemporal soberano e sacerdote, senhor dos senhores, que governa uma sociedade cristã a um tempo heterogénea e igualitária, onde as maravilhas de todo o tipo florescem entre o milagroso e o monstruoso, entre o quase divino e o quase diabólico. Na verdade, o império do Preste João é imaginado como uma longa alegoria milenar preparatória da descida da Nova Jerusalém apocalíptica, em estreita articulação com a cosmografia e a cartografia medievais europeias, segundo as quais a Ásia oriental - em cuja extremidade se localizaria o Paraíso terrestre - era concebido como a região da ecúmena mais próxima da esfera celeste. O soberano indiano apresenta-se, por outro lado, como uma reformulação cristã do projecto imperial de Alexandre Magno (de unificação do Oriente e do Ocidente), que encontra na literatura alexandrina grande parte do seu suporte contextual (geográfico, zoológico, sociológico, etc.)."


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