Imagens daqui.
Nomearemos, por fim, três poetisas ligadas ao nosso território. Da princesa Buthayna (século XI), apenas nos chegou um único poema, em forma de epístola dirigida a seu pai, al-Mu'tamid, então já no exílio. Buthayna que, depois do desterro daquele, havia sido feita esvrava e vendida a um mercador, usa os versos para pedir autorização para casar com um filho do seu comprador. A qualidade do poema autoriza a pensar que este teria sido apenas um entre muitos dos que terá escrito.
Maryam al-Ansârî, natural de Silves (séculos X-XI), foi uma dessas numerosas intelectuais andalusinas que, além de poetisa, era mestra de literatura, tendo alcançado assinalável notoriedade na sociedade do seu tempo. (...)
Outro exemplo notável do protagonismo cultural e social das mulheres luso-árabes é-nos dado por uma poetisa do período almôada (século XII). Ficou conhecida para a posteridade apenas como al-Shilbîa (a Silvense), de tal modo a sua nomeada dispensava qualquer outra apresentação. Governava então o Alandalus o califa almôada Ya'qûb al-Mansûr e a cidade de Silves estava sobrecarregada de impostos. Pois a "Silvense" foi escolhida pelos seus concidadãos para, em nome da cidade, apresentar uma petição de protesto ao soberano. A poetisa elaborou para a circunstância um curto poema, tão belo de forma e eficaz de conteúdo que o pedido foi atendido e a carga fiscal levantada.
Não é demais sublinhar-se a altíssima conta em que era tido o talento literário entre os andalusinos. Os dotes poéticos valiam, quase sempre, ao seu possuidor a ascensão social pois, tarde ou cedo, um príncipe ou um mecenas haveria de reparar neles. (...) Os poetas árabes, para além da poesia amorosa, cultivavam quer a sátira quer o panegírico, o que lhes dava protagonismo e visibilidade suficientes para utilizarem, sobretudo a partir de finais do século X, o seu estro como modo de vida.
A poesia luso-árabe era, essencialmente, de cariz aristocrático. Com o tempo, «democratiza-se» e, a partir de finais do século X, os novos géneros estróficos (...) «descem à rua» trazidos pelos próprios poetas da corte. Servem de base a canções/ danças populares que, após a conquista cristã, influenciaram decisivamente as cantigas de amigo galaico-portuguesas, tal como já haviam influenciado as de amor de origem provençal. O ideal cavalheiresco, bem como o do amor cortês, têm uma inegável componente islâmica, com a sua natural repercussão nos topoi poéticos.
Adalberto Alves, A Herança Árabe em Portugal, CTT Correios de Portugal, 2001, pp. 72-77.
Sem comentários:
Enviar um comentário