Imagem daqui.
Faltam-me as palavras. Efectivamente faltam-nos as palavras. Diz-se que numa das línguas faladas pelos indígenas da américa do sul, talvez na amazónia, existem mais de vinte expressões, umas vinte e sete, creio recordar, para designar a cor verde. Comparando com a pobreza do nosso vocabulário quanto a esta matéria, parecerá que devia ser fácil para eles descrever as florestas em que vivem, no meio de todos aqueles verdes minuciosos e diferenciados, apenas separados por subtis e quase inapreensíveis matizes. Não sabemos se alguma vez o tentaram e se ficaram satisfeitos com o resultado. O que, sim, sabemos, é que um monocromatismo qualquer, por exemplo, para não ir mais longe, o aparente branco absoluto destas montanhas, também não decide a questão, talvez porque haja mais de vinte matizes de branco que o olho não pode perceber, mas cuja existência pressente. A verdade, se quisermos aceitá-la com toda a sua crueza, é que, simplesmente, não é possível descrever uma paisagem com palavras. Ou melhor, ser possível, é, mas não vale a pena. Pergunto se vale a pena escrever a palavra montanha se não sabemos que nome se daria a montanha a si mesma. Já a pintura é outra coisa, é muito capaz de criar sobre a paleta vinte e sete tons de verde seus que escaparam à natureza, e alguns mais que não o parecem, e a isso, como compete, chamamos arte. Às árvores pintadas não caem as folhas.
José Saramago, A Viagem do Elefante, Lisboa, Editorial Caminho, 2008, pp. 241-242.
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