Imagem daqui.
“A
despesa interna duma casa de nobre português é tão moderada quanto é excessiva
a que diz respeito ao alarde exterior e à ostentação, como ao número de criados
de libré, mulas, cavalos de mão, enfim, tudo quanto pode deslumbrar, impor-se e
dar uma ideia exagerada de riqueza ou da autoridade do senhor. Os numerosos criados
são sustentados com carne cozida com arroz, cortada e dividida em rações, com
excepção dos dias de jejum e abstinência, que são frequentes, independentemente
dos quarenta e seis dias da Quaresma, em que lhes dão bacalhau. Raras vezes
precisam de vinho e, quando o pedem, trazem-lho em em pequena quantidade e de
muito má qualidade, da taberna mais próxima; bebem, porém, em abundância, bela
água clara; e à noite comem um pedaço pequeno de carne ou sardinhas com muita e
excelente alface ou outra salada, temperada com azeite e vinagre, que é o molho
universal, e também bom pão (que comem tanto como os franceses e os espanhóis);
nisto consiste a sua ceia. Os patrões, de manhã, almoçam geralmente chocolate,
depois de ter ouvido a missa na capela da casa, que é magnífica, resplandecente
de ouro, e guarnecida de figuras, anjos alados, pintados e esculpidos. O grande
regalo, o grande luxo de todos os momentos, é uma quantidade enorme de doces
que conservam para todas as ocasiões, e que, com o chocolate, são as únicas
coisas que não mandam buscar ao merceeiro ou ao mercado; os doces levam-nos a
beber grandes copos de água, que os engordam de uma forma surpreendente. Ouvi muitas
vezes dizer, em Madrid, muito antes de aqui vir, que se encontrava em Lisboa
muito mais gente gorda do que em qualquer outra parte, e com efeito nunca vi
tantas pessoas gordas, mal feitas e baixas e de curto fôlego, como na nobreza
portuguesa.”
Arthur William Costignan, Cartas de Portugal
(1778-1779), tradução, prefácio e notas de Augusto Reis Machado, vol. II, Lisboa,
Edições Ática, 1946, p.122.
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