Imagem daqui.
"Quem passe num dia de chuva numa rua principal da província verá, através das vitrines embaciadas, um amontoado de coisas que brilham e que parecem atiradas para ali para estarem arrumadas, e não para serem expostas. São jarras de loiça e canecas com pinturas regionais e frases típicas ou provérbios; são imagens de santos e de padres famosos pela sua beatitude; são dançarinas, ciganas, cupidos e fontes com pombas e grinaldas; são placas com sentenças e conselhos, andorinhas pintadas dum negro fuliginoso; lâmpadas de cabeceira, ferros eléctricos com mudanças de calor e borrifadores, crucifixos, espelhos com motivos Mary Quant, estojos de toda a espécie, tabuleiros, grelhadores, loiça inglesa, almofadas, pratinhos para copos, sábios chineses e potes para chá, tacinhas de cobre, de pó de mármore, de madeiras de buxo. E estanhos, ao gosto medieval, em forma de gomil, de bacia de barbeiro, de pratos que parecem dignos de Carlos Magno, com pedras embutidas. Tudo isso vem de toda a parte, com guias alfandegárias ou de contrabando, coisas destinadas mais ao desejo ocioso, do que à necessidade das diferentes fortunas. Um povo inteiro, muitos povos estão representados nessas coisas. Elas representam, de facto, a felicidade como atitude - e não há talvez outra, nem mais barata nem mais inteligível. (...)"
Agustina Bessa-Luís, Crónica do Cruzado Osb., 1ª edição 1976, Lisboa, Guimarães Ed., 2015, p. 136.
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