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Antigo blogue do projeto novasoportunidades@biblioteca.esjs, patrocinado pela Fundação Calouste Gulbenkian
Escola Secundária José Saramago - Mafra

terça-feira, 31 de maio de 2016

FERREIRA DE CASTRO - MOSTRA

Ferreira de Castro (1898-1974), página manuscrita de Criminoso por Ambição.
Imagem e informações detalhadas aqui.


Mostra patente na Biblioteca Nacional, de 8 de junho a 29 de julho.


segunda-feira, 30 de maio de 2016

DO NOME VIII


Edward Burne-Jones (1833-1898), O Jardim das Hespérides.
Imagem daqui.



«Na tradição escolar instaurada por Dozy, o nome "al Andaluz" - que, até prova em contrário, aparece escrito pela primeira vez como denominação da Hispânia num dinar cunhado em 716 (...) - é relacionado com os Vândalos, pressupondo que a Bética teria sido chamada, ocasionalmente, "Vandalicia". Muito recentemente, no entanto, J. Vallvé (...) levantou uma hipótese que nos parece mais verosímil. Segundo esse autor, a origem da palavra deve relacionar-se com o velho mito da Atlântida, criado ou veiculado por Platão e que entrou no imaginário mediterrânico. É, pois, de considerar que a expressão "Jazirat-al-Andaluz", "a ilha de al Andaluz", adoptada pelos textos clássicos árabes, seja simplesmente a tradução-adaptação de "ilha do Atlântico" ou "Atlântida". Repare-se que na palavra "alándaluç" o acento recaía na antepenúltima sílaba e não na última, como hoje acontece (...).

Quando Al-Razi, e, com ele, a maioria dos historiadores e geógrafos árabes, se refere aos primeiros habitantes da Península Ibérica indica os "al-andlis", ou então um "al-andlis", filho de Tubal, filho de Jafet, filho de Noé. Com Hércules, Atlantes e Atlântida, a mitologia greco-romana prolonga-se pela historiografia árabe, que, afinal, é a sua principal e por vezes única herdeira. A Península Ibérica, avistada como uma ilha para quem vem da costa africana, foi certamente a origem e o objecto do mito dourado da Atlântida. Se tivermos em conta que, para o oriente mediterrânico e desde as primeiras aventuras dos marinheiros de Tiro, a Ibéria era o país das ninfas do poente, o jardim dos pomos de ouro das hespérides, não é difícil ligar a palavra "al Andaluz" a uma criação culta, que vem dar corpo a tradições veiculadas pelos mercadores levantinos. O que interessa notar é que, a partir de princípios do século VIII d. C., as convulsões e conquistas militares que abalaram a Ibéria não só introduziram uma nova denominação da Península Ibérica, como esta vai encontrar a sua fundamentação em velhos mitos, originários e alimentados no outro extremo do Mediterrâneo. Depois de um aparente hiato histórico em que a Hispânia goda se vira para si própria, o surgimento do al Andaluz é como que um regressar ao velho seio mediterrânico, sob a chancela dos seus antigos e prestigiados esteios intelectuais."

Cláudio Torres e Santiago Macias, "O Gharb al-Andalus", in História de Portugal (José Mattoso), Lisboa, Círculo de Leitores, vol. I, p. 363.


sexta-feira, 27 de maio de 2016

PASSEIOS LITERÁRIOS POR LISBOA

Imagem e todas as informações aqui.


CAMILO CASTELO BRANCO, O JUDEU



«Neste mesmo dia, Simão de Sá conduziu Jorge de Barros à sua livraria. Como reposteiro à porta da biblioteca, via-se um painel, que figurava o Sermão da Montanha, quadro fraudulento com que o hebreu edificava os hóspedes cristãos. O quadro enrolou-se, quando o dedo de Simão carregou na cabeça dourada do prego em que o painel impendia. Descobriu-se um espaço de parede coberta de arrás como o restante da saleta. O hebreu acurvou-se: carregou noutra mola, que fez subir enrolada uma espécie de cortina.

- Aqui tem os meus livros, senhor Jorge. Muitos não lerá, que são hebraicos; mas deles há muitos em latim, castelhano e português. Aqui tem O Livro da Fé Demonstrada pela Razão, de Scem Tou de Leão. Aqui tem O Livro dos Justos, de Samuel Chasid, impresso em mil quinhentos e oitenta e um. Este é o Pão das Lágrimas, de Samuel Ozeda de Saphet. Aqui tem o Talmude compendiado por Salomão Luria, e a Lâmpada de Ouro, do mesmo escritor. Aqui tem a Justiça dos Séculos e mais dezasseis volumes do judeu português Isaac Abravanel, descendente de David, nascido em Lisboa em mil quatrocentos e trinta e sete, e falecido em Veneza por mil quinhentos e oito, quando ali fora conciliar os portugueses com os venezianos. Aqui está o Facho do Preceito e mais seis volumes do israelita português Joseph Ben Don David Ben Don Joseph Abem Jachiia, falecido na Itália em mil quinhentos e quarenta e nove. Estoutro é o O Livro da Luz, do hebreu português Jos Ciiahu. Agora lhe ofereço um livro do meu ascendente Abraão de Ferrara que exercitou a medicina em Lisboa. Lindíssimo é essoutro livro de Abraão Sabua, também português: chama-se o Ramalhete de Mirra. Aqui está o celebrado comentário sobre o Pentateuco, do médico do Porto, chamado Menachem Porto, pai do grande cabalístico Abraão Ben Sechiel Cohen Porto, cujas Aldeias de Jair (Chavot Jair) lhe ofereço, como leitura encantadora. Finalmente, senhor Jorge de Barros, aí estão mil volumes de escritores judaicos. Não lhe aconselho que leia os enfadonhos escrutadores da cabala, que são absurdos, sem serem ridículos. Os livros de moral parecem-me excelentes, mormente os que procedem dos terapeutas e caraítas. Nem Sócrates antes, nem Saulo ou Paulo depois, escreveram melhor.

Começou Jorge a sua leitura pelo Pão das Lágrimas.

Sara e Judite, filha de Simão, sentaram-se uma de cada lado da cadeira do moço e ouviam-no. Era um quadro mimoso para pintura!»

Camilo Castelo Branco, O Judeu, Silveira, E-Primatur, 2016, pp. 61-62. 


quarta-feira, 25 de maio de 2016

ARTE: FORMA E INSPIRAÇÃO


Cariátides no Templo do Erecteion.
Imagem daqui.



«(...) Toda a arte, como disse Louis Bréhier, implica uma prioridade dada à técnica que melhor encarna as suas aspirações. A arte mediterrânica deu-a à escultura, duplo do corpo humano, de que a arquitectura conserva a nostalgia, já que lhe pede emprestados os seus princípios de proporção e, às vezes, até as suas formas, nas cariátides, por exemplo. A arte bárbara ou estépica reserva-a à decoração: ourivesaria ou tecido, onde a linha pode agir sem qualquer constrangimento. As artes intermediárias experimentaram a atracção dos dois pólos. Onde está presente o "complexo" Bárbaros-Ásia, a pintura e a escultura tenderam a reabsorver-se no ornamental, pelo reino do traçado e do plano. Onde dominou a tradição greco-romana, a decoração e a pintura procuraram evocar a escultura; a ourivesaria carolíngia é disto uma prova: retoma a geometria em proveito do alto-relevo, preferindo o trabalho dos admiráveis bronzistas românicos. (...)»

René Huyghe, Sentido e Destino da Arte I, Lisboa, Edições 70, 1986, p. 294.



terça-feira, 24 de maio de 2016

sexta-feira, 20 de maio de 2016

MONDRIAN E A PINTURA

Piet Mondrian (1872-1944), Victory Boogie-Woogie (1942-1944).
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"Mondrian é quem percebe o sentido mais revolucionário do cubismo e lhe dá continuidade. Compreende que a nova pintura, proposta naqueles planos puros, requer uma atitude radical, um recomeço. Mondrian limpa a tela, retira dela todos os vertígios do objeto, não apenas a sua figura, mas também a cor, a matéria e o espaço que constituíam o universo da representação: sobra-lhe a tela em branco. Sobre ela o pintor não representará mais o objeto: ela é o espaço onde o mundo se harmonizará segundo os dois movimentos básicos da horizontal e da vertical. Com a eliminação do objeto representado, a tela - como presença material - torna-se o novo objeto da pintura. Ao pintor cabe organizá-la, mas também dar-lhe uma transcendência que a subtraia à obscuridade do objeto material. A luta contra o objeto continua.

O problema que Mondrian se propôs não podia ser resolvido pela teoria. Se ele tentou destruir o plano com o uso das grandes linhas pretas que cortam a tela de uma borda à outra - indicando que ela confina com o espaço exterior -, ainda essas linhas se opõem a um fundo, e a contradição espaço-objeto reaparece. Inicia, então, a destruição dessas linhas e o resultado disso está nos seus dois últimos trabalhos: Broadway Boogie-Woogie e Victory Boogie-Woogie. Mas a contradição não se resolve de fato, e se Mondrian vivesse mais alguns anos talvez voltasse à tela em branco donde partira. (...)"

Ferreira Gullar, "Morte da Pintura", in Poesia Completa, Teatro e Prosa, Rio de Janeiro, Editora Nova Aguilar, 2008, p. 1002.



quinta-feira, 19 de maio de 2016

quarta-feira, 18 de maio de 2016

XADREZ NA BIBLIOTECA (20)

Cartaz da autoria de Irina Gonçalves, aluna do 12.º AV1 desta escola

MIGUEL TORGA SOBRE FERNANDO PESSOA II


Rio Mondego, Coimbra, vista a partir da Ponte de Santa Clara.
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"Coimbra, 11 de Dezembro (de 1950) - Não há dúvida: - A poesia portuguesa dividiu-se. A um grande rio barrento veio desembocar um corgo cristalino. No mar do esquecimento que espera todas as realizações humanas, talvez se juntem e desapareçam. Mas até lá, vê-se nitidamente a fronteira das duas águas. Foi uma graça formal, uma economia de meios, uma modernidade de imagens e de sensações que vieram arejar uma retórica de comício, um sentimentalismo piegas, um bombeirismo arcádico, que desgraçadamente têm fundas raízes no nosso temperamento.

Embora tardiamente, também ao luso Parnaso chegou um pouco do gosto, do arrojo e da força renovadora que são a glória de Baudelaire.

A marca literária dos tempos presentes é o desejo incansável de uma originalidade a todo o preço. E sendo certo que é melhor possuir a originalidade do que procurá-la, em última análise o que importa é encontrá-la nas obras. O que felizmente vai acontecendo por cá.

Caudalosa, porém, a velha corrente recusa-se a considerar sequer a transparência que a margina. Fiéis ao passado, teimosamente antediluvianos, certos nomes com prestígio insistem na sua impetuosa cegueira, ou porque realmente não podem, ou porque verdadeiramente não querem ver a perdição. Um refluir incansável e trágico do mau gosto ancestral apoia-os, de resto, com pertinácia. É ver o que se passa neste momento: - Ainda a aura benéfica de Fernando Pessoa está a crescer, e já se aperram as pistolas contra ela.

Seja como for, os dados estão na mesa; digam o que disserem, não há despeitos impotentes que apaguem na pedra a marca de certas presenças. O rio barrento tem à perna um espelho de claridade..."

Miguel Torga, Diário V, Coimbra, edição do autor (revista), s/ d, pp. 172-173.



segunda-feira, 16 de maio de 2016

ARTE: REGRAS E TRANSGRESSÕES

Miguel Ângelo, Escada da Biblioteca Laurentina.
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«(...) Pode haver regras do gosto, mas elas não garantem a beleza de uma obra de arte, que pode mesmo residir na transgressão às regras do gosto. As quarenta e oito fugas de Bach evidenciam todas as regras da composição para fuga, embora o façam criativamente, mostrando como as regras podem ser usadas como plataforma para nos elevarmos a um nível de liberdade mais elevado. Obedecer-lhes meramente seria uma receita para a estagnação, como mos exercícios pelos quais se começa as lições de contraponto.

Também na arquitectura pode haver edifícios que nós encaramos como governados inteiramente por regras, como o Pártenon. Porém não é isso que explica a sua perfeição. A serenidade e a solidez do Pártenon vêm ao de cima devido a esse "não sei quê" de criativo - a escala, as proporções, o detalhe, que emergem quando a obediência às regras acaba. E, claro, há a beleza que surge do desafio aberto às regras, como a Biblioteca Laurentina de Miguel Ângelo.

É mais ou menos óbvio que não há na Natureza "obediência às regras" ou "desafio às regras". No entanto há simetrias, harmonias, proporções e também o desafio estético resultante da inexistência destas coisas. Os pensadores do século XV, que desejavam adoptar a beleza natural como paradigma do objecto de bom gosto, depressa acolheram o contraste de Burke entre o sublime e o belo. Também no caso da arte podemos distinguir com proveito aquelas obras que nos comprazem devido à ordem, harmonia e perfeição governadas por regras, que exibem (como as fugas de Bach, as Virgens Santíssimas de Bellini ou os versos de Verlaine), e aquelas que, pelo contrário, nos comprazem porque desafiam e perturbam as nossas rotinas, rebentando com as grilhetas do conformismo e destacando-se da tradição a que pertencem (como o Rei Lear ou a Sexta Sinfonia de Tchaikovsky). Todavia, assim que fazemos esta distinção percebemos que até na obra mais ordenada e governada por regras é impossível fixar um "padrão do gosto" apelando às regras. Não são as regras, mas o seu uso, que nos atrai numa fuga de Bach ou numa Virgem de Bellini. Aqueles que procuram um padrão nas regras expõem-se à refutação, bastando para isso salientar-se que a obediência às regras não é nem uma condição necessária, nem uma condição suficiente, da beleza. Pois, se fosse suficiente poderíamos (...) adquirir gosto em segunda mão; se fosse necessária, a originalidade deixaria de ser um sinal de êxito."

Roger Scruton, Beleza, Lisboa, Guerra e Paz, 2009, pp. 131-132.


sexta-feira, 13 de maio de 2016

KUM KAPI - TAPETES VIAJANTES

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Para visitar, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, de 13 de maio a 19 de setembro de 2016.



SUGESTÃO DE VIAGEM II - DUBLIN, IRLANDA




Sugestão apresentada pela Aluna Mariana Francisco, do 12º ano, do Curso Profissional de Turismo.



quinta-feira, 12 de maio de 2016

EÇA DE QUEIRÓS E MACHADO DE ASSIS


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«(...) Entre Machado de Assis e Eça de Queiroz sempre preferi o português ao nosso grande mulato. "Ah... porque o Machado é bem mais sutil!..." - diz-se, comparando-se, por exemplo Capitu à Luiza do "Primo Basílio" (que o próprio Machado, ciumento, acusou de plágio da "Eugenie Grandet"). "Ahhh!... porque o Machado tem mais níveis de significação, mais complexidade psicológica etc. e tal..." É verdade. Hoje, eu também acho. O grande Machado atingiu subtons que Eça nem tentou, por escolha. Machado é mais inglês (Sterne, Dickens); Eça é saído das costelas de Balzac e Zola e funda uma literatura caricatural contra as perdidas ilusões ibéricas, com um riso deslavado, com uma proposital "falta de sutileza" que resulta depois finíssima. Eça cria um realismo quase carnavalizado, sem anseios de transcendência. Machado é mais "nauseado". Deixa-se envolver por um pessimismo que o claro riso de Eça recusa. O "tipo" eciano não tem grande "complexidade"; mas isso talvez seja o que a nossa mediocridade social merece. Ele não cria personagens com uma psicologia sofisticada. Para ele, somos mesmo "tipos". Como em seu neto Nelson Rodrigues, há nele uma superficialidade "profunda", muito atual neste tempo em que os valores idealizados caíram no chão. Eça é um escritor político. (...)»

Arnaldo Jabor, "Eça e Machado nos previram", in jornal O Globo, Brasil, 10/ 05/ 2016.


O ESPECIALISTA (SEGUNDO ÁLVARO DE CAMPOS)


José Mongrell i Torrent (1870-1937), Los Cavadores (1910).
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"Um especialista é um homem que sabe qualquer cousa de uma cousa e nada de todas as cousas. De uma cousa não se pode saber senão qualquer cousa, porque o conhecimento humano é limitado. E, para perceber qualquer cousa seria preciso perceber todas as cousas, pois uma cousa é parte de todas as cousas. O especialista, pois, é um homem  que não sabe nada e vive d'essa sciencia.

O especialista é útil apenas quando a sua especialidade é tam restricta que não tem importancia. Pode haver bons especialistas de pregar pregos; não pode haver bons especialistas de construcção de civilizações. Há muito bons cavadores e nenhum bom psychiatra.

O especialista é um homem que tem a opinião dos outros, embora sobre um só assumpto. O especialista é incapaz de iniciativa. Por isso os especialistas são muitos e felizes."

Fernando Pessoa, Obra Completa de Álvaro de Campos, edição de Jerónimo Pizarro e Antonio Cardiello, Lisboa, Tinta-da-China, 2014, p. 517.



quarta-feira, 11 de maio de 2016

DO NOME VII


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O seu nome é gracioso e muito próprio dela:
Respira um vago tom de música inocente;
E lembra a placidez de um lago transparente,
Recorda a emanação tranquila duma estrela.

Lembra um título bom, que logo nos revela
A ideia do poema. E todo o mundo sente
Não sei que afinidade entre o seu ar dolente,
A sua morbidezza, e o nome próprio dela.

E chego a acreditar - ingenuamente o digo -
Que havia um nome em branco, e Deus pensa consigo
Em traduzi-lo enfim numa expressão qualquer:

De forma que a mulher suave e graciosa
Faz parte deste nome um tanto cor-de-rosa,
E este nome gentil faz parte da mulher.

Guilherme de Azevedo (1839-1882)


366 Poemas que Falam de Amor, escolhidos por Vasco Graça Moura, Lisboa, Quetzal, 2009, p. 519.



terça-feira, 10 de maio de 2016

UMA PORTA


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VERSOS DE ENTRETER-SE

À vida falta uma parte
- seria o lado de fora -
pra que se visse passar
ao mesmo tempo que passa

e no final fosse apenas
um tempo de que se acorda
não um sono sem resposta.

À vida falta uma porta.

Ferreira Gullar, Poesia Completa, Teatro e Prosa, Rio de Janeiro, Editora Nova Aguilar, 2008, p. 330.



segunda-feira, 9 de maio de 2016

CANFOREIRA

Canforeira (Cinnamomum camphora).
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Olha também Bornéu, onde não faltam
Lágrimas no licor coalhado e enxuto
Das árvores, que cânfora é chamado,
Com que da ilha o nome é celebrado.

Luís de Camões, Os Lusíadas (Canto X, estância 133).



"(...) as meninas brincam, a correr, numa algazarra, dando cambalhotas que servem para as afastar (a elas e a nós) da casa, em direcção à natureza. Subitamente, somos confrontados com um enorme e velho canforeiro que se agiganta sobre as crianças como uma montanha. Esta árvore há-de tornar-se uma personagem central na história (...). Mas só depois de as crianças regressarem a casa, quando uma noz, uma só, cai misteriosamente no chão, é que começamos a perceber que aquele é realmente um lugar assombrado.

É exactamente nesta altura, com o pai a sugerir algumas explicações racionais para o que aconteceu - esquilos, talvez, ou ratos - que Miyazaki nos mostra o tal poço, aquilo que em Nova Iorque nos tinha parecido trivial, meramente utilitário.

Então, as meninas abrem a porta das traseiras. Há luz lá fora, do lado de dentro está escuro. Quando a porta se abre, vemos umas pequenas criaturas pretas e ouvimos uma espécie de borbulhar agudo enquanto elas fogem da luz. Lembramo-nos de morcegos e baratas, mas estas criaturas são de outro tipo.

As meninas gritam mas então, independentes uma da outra, encolhem os ombros e avançam, numa acção que não só intensifica o drama como dá início a um circuito arquitectónico. Parando o filme a qualquer momento, podíamos ter uma sessão de explicações sobre a casa japonesa, mas continuemos em frente (...)."

Peter Carey, O Japão é um Lugar Estranho, Lisboa, Tinta-da-China, 2011, pp. 146-147.



sexta-feira, 6 de maio de 2016

QUADRAS POPULARES 2016

DO NOME VI

Rafael, Escola de Atenas, Platão (pormenor)(1509-1511).
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"(...) Crátilo diz a verdade quando diz que os nomes pertencem às coisas por natureza e que nem todas as pessoas são artífices dos nomes, mas só aquele que fixa os olhos no nome que é, por natureza, o nome de cada coisa e é capaz de impor a sua forma às letras e às sílabas. (...)"

Platão, Crátilo, Lisboa, Instituto Piaget, 2001, p. 53, (390e).


terça-feira, 3 de maio de 2016

DO SILÊNCIO


Eça de Queirós em Newcastle, 1875.
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«Rodrigues Lapa, na Estilística..., considera o silêncio um dos substantivos mais difíceis de qualificar na literatura portuguesa. Isto porque não há plumitivo que não abuse dos "profundos", "sepulcrais" e "pesados". Estas coisas contam muito para quem não seja leitor de A Rosa do Adro, de Corin Tellado, daqueles romancecos paroquiais dos Estados Unidos e tenha frequentado autores em criança.

Ficou célebre (entre os_few, happy few_) o "silêncio côncavo, hostil" com que Eça inovou em A Capital, se não erro. Agora, nesta releitura de Os Maias, depara-se-me um "silêncio oleoso". (...)»

Texto do escritor Mário de Carvalho, disponível em http://mariodecarvalho.com/currente-calamo


domingo, 1 de maio de 2016

DIA DA MÃE


Elisabeth Jerichau-Baumann (1819-1881), Uma Mulher Felá Egípcia com o seu Bebé (1872).
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