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Escola Secundária José Saramago - Mafra

quarta-feira, 16 de julho de 2014

A ALMA LUSÍADA

Imagem daqui.



“A primeira grande tónica da nossa psicologia colectiva parece ser o paradoxal. Centra-se em torno do binómio passividade-acção.

Por um lado, somos vistos como pessimistas, contemplativos, falhos de iniciativa e tendentes ao servilismo; por outro, marcámos a História como povo determinado, criativo, aventureiro e idealista. Se o nosso pessimismo e demais sentimentos depressivos são tão reais, não parecem, contudo, ter-nos condicionado como povo, nem impedido de realizarmos o nosso destino concreto. Antes pelo contrário. Quase sempre as grandes tragédias históricas se converteram em símbolos positivos dinamizadores do futuro. Do confinamento físico a que Castela nos sujeitou na Idade Média, nasceu a aventura marítima; do desastre de Alcácer Quibir, nasceu o mito sebástico; das grandes comoções colectivas têm nascido, ao longo dos séculos, as grandes solidariedades nacionais. (...)

Teixeira de Pascoaes via demarcada duas linhas psíquicas na Península Ibérica: a sentimental e a quixotesca: «O lar sentimental da Ibéria - escrevia - é a Lusitânia; como Castela é o seu palco teatral ou quixotesco». Mas as duas linhas, na alma lusíada, não se excluem: complementam-se. Somos, assim, uma espécie de síntese de alma; mas uma síntese que, sendo paradoxal, é, contudo, assimilada numa predominância sentimental. Somos - continua Pascoaes - «lembrança e esperança, carne do Pança e osso do Quixote, fugitivo na Serra do Marão. O imortal cavaleiro, isolado de Castela, de dramático, torna-se elegíaco. E temos a alma dupla da Ibéria, ou uma só com duas faces: a quixotesca e a saudosa».

Outra característica da nossa personalidade lusíada é o pendor aparentemente antifilosófico. O nosso pensar arranca da experiência, do concreto. Somos intuitivos: pensamos sentindo. O nosso conhecimento é conhecimento «de experiência feito», originado, como diria o rei-filósofo D. Duarte, mais do sentir próprio do que de teorizações abstractas: «nom compre leer per outros livros, (...), mes cada huũ (…), consiire seu coraçom no que já per feitos desvairados tem sentido».

É assim que também o genuíno pensamento português, a sua «filosofia» original, deve ser procurado não nas sistematizações mentais, mas, antes, nos seus poetas. «Uma verdade, quando aparece no mundo, - diz Pascoaes – é o poeta a primeira pessoa que visita…»; como que a confirmar aquela sua outra palavra: «Aonde não chega a razão, chega a inspiração». (…)”

Alfredo Antunes, Saudade e Profetismo em Fernando Pessoa – Elementos para uma Antropologia Filosófica, Braga, Publicações da Faculdade de Filosofia, 1983, pp.69-70.


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