Adoração dos Reis Magos, do Maestro dell'Albero della Vita (1347), fresco da Basílica de Santa Maria Maior, em Bergamo
Imagem daqui.
A ESTRELA DO NATAL
Era
Inverno. Soprava
Da
estepe um grande vento.
E
no fundo da gruta, no flanco da colina,
Tinha
frio a criança.
A
gruta estava repleta
Dos
animais domésticos,
E
em torno flutuava um tépido vapor.
Das
mantas sacudindo o feno das enxergas
E
grãos de milho,
Do
alto do rochedo os pastores olhavam,
Ensonados
olhavam.
(…)
E
perto deles, mais tímida que uma lanterna,
Num
pátio pobre,
A
estrela nunca dantes vista
Iluminava
o caminho que leva a Belém.
(…)
Luzia
como se fosse feno em chamas,
Como
um fogo de palha,
No
mundo apavorado
Pela
aparição da estrela nova.
No
céu avermelhava-se a aurora,
A
aurora profética,
E
dirigiam-se os três astrólogos
Ao
chamamento desses fogos ignotos.
Os
camelos da escolta levavam presentes,
E
enfeitados, carregados, os burros, em curtos passos,
Vinham
de escantilhão pela colina abaixo.
Uma
estranha miragem atravancava o horizonte,
E
era o futuro, e eram os sonhos de todos os séculos,
Os
pensamentos e os sonhos de um mundo novo,
Os
sonhos das crianças, toda a arte dos nossos museus,
As
farsas dos duendes, a obra dos mágicos,
As
árvores de Natal, os sonhos das crianças,
A
chama trémula das velas, os cabelos dos anjos,
…
E mais asperamente soprava da estepe o grande vento…
Todos
os pomos de ouro, todas as bolas de ouro.
Amieiros
cercavam com os ramos o tanque,
Mas
do alto do rochedo via-se o brilho da água,
Entre
os ninhos dos pássaros e os ramos das árvores,
E
os pastores viam, para lá do tanque,
Passarem
camelos e burros carregados.
E
exclamavam, aconchegando-se nas mantas:
“Vamos
com esta gente adorar o milagre.”
Batiam
os pés e empurravam-se através da neve.
Vestígios
de pés nus ao presépio levavam,
Vestígios
que brilhavam com um fulgor de mica.
Agitavam-se
os cães em torno das pegadas
Como
diante do fogo que salta de um tição.
E
esta noite fria assemelhava-se às noites dos contos:
Iam
e vinham sombras invisíveis,
Do
meio do caminho para os taludes cobertos de neve.
Os
cães estavam inquietos; voltavam-se amiúde,
Medrosos,
e às pernas dos donos se acolhiam.
Neste
mesmo caminho, e pelo mesmo campo,
Caminhavam
anjos no meio da multidão,
Emissários
ocultos aos olhos dos mortais,
Mas
cujos passos através da neve vestígios desenhavam.
Junto
de um grande rochedo, a multidão parou.
Aclarava
a madrugada e viam-se alguns cedros.
A
Virgem perguntou de onde vinha tanta gente.
“-
Somos os pastores e os anjos do céu
E
aqui vimos prestar nossa homenagem.”
“-
O curral é pequeno. Têm de esperar à porta.”
No
confuso nevoeiro, cinzento como cinza,
Porqueiros,
vaqueiros, pastores, os pés batiam,
E
peões e cavaleiros proferiam pragas entre eles.
Ao
pé de uma árvore escavada que servia de bebedoiro,
Os
camelos gemiam, escoucinhavam os burros.
Aproximava-se
a manhã. E no céu a luz
Começou
a expulsar
A
última poeira cinzenta das estrelas,
E
Maria descobriu os magos no meio da turba:
Foram
eles os primeiros a entrar no presépio.
A
criança dormia, resplandecente, na manjedoira,
E
por único trajo, a guardá-la do frio, apenas tinha
O
bafo que vinha das ventas do boi, dos beiços do burro.
De
pé, os visitantes, na noite do curral,
Docemente
trocavam tímidas palavras.
E,
na sombra, um pastor, tocando o braço de um dos magos,
Apontou-lhe,
à entrada, a estrela nova,
A
estrela de Natal que ficara
A
contemplar Nossa Senhora.
Boris Pasternak, “A Estrela do Natal”
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