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Escola Secundária José Saramago - Mafra

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

DO NOME III


Imagem daqui.



"(...) Os Ciganos (vindos de Hespanha no seculo XV ou XVI) formam entre nós, como os Judeus, e outr'ora os Mouros-fôrros, um grupo etnico, ainda que não tão importante, de modo algum, como estes, e de natureza muito diversa. Subordinam-se ostensivamente e no conjunto ás leis portuguesas, vivem porém mais ou menos em hordas, entendem-se entre si por linguagem propria, e associam-se para (...) comércio e defesa. (...)

A Ciganos ouvi contar que quem leva a efeito o bàtismo é o mais velho dos presentes: mergulha por tres vezes a cabeça da criança na agua, emquanto o padrinho toca, parece que outras tres vezes, um guiso ou campainha (...).

Na ocasião do bàtismo, impõe-se á criança um nome, a que chamam nome de ribeiro, de ribeira, de rio; a um Cigano em conversa escapou também a expressão nome de barranco, pois barranco é expressão hidrografica muito alentejana, e algarvia, no sentido de corrente de agua que em regra séca de verão. Das referidas expressões a mais vulgar creio ser nome de ribeiro, que se contrapõe ao nome de pia (...) dado depois pelo padre na igreja. (...)

Eis alguns exemplos de nomes de ribeiro indicados paralelamente a nomes de pia:
Abob'ra (nome geografico, provindo dos Casais da Abobora) - Dina.
Bombiano - Antonio.
Cabelinho d'oiro - João.
Cabeludo - Emilio.
Caracol - José.
Chocalhinha badalinha - Esperança.
Escaravelho - Mariana.
Espilradeira (assim terminado em -a) - Joaquim Tau.
Florida - Emilia.
Inverno - João Abreu.
Laganhoso - Pedro.
Mandil - Josué.
Martelo - João.
Moira - Ludovina.
Moiro - Diamantino.
Mostarda - Manuel.
(...)
Ribêra (isto é, Ribeira de Santarem) - Isaura.
Santarena - Maria.
(...)
Vai à cepa - Julio.
(...)

O caracter do nome de ribeiro é ser pseudonimo, para corresponder ao calão. O que os Ciganos querem é que ninguem de fóra da vida da familia os entenda, nem na linguagem, nem nos nomes (...). Os nomes de ribeiro, a que igualmente ouvi chamar «apelidos», têm origem como as alcunhas ordinarias (...): alguns significam locais de nascimento, como me explicaram, por exemplo, Moira (Moura), Montemór, Ribêra, Abob'raSantarena; outros indicam profissões das mães, por exemplo, Pexêra; Moiro explicaram-me que resultou de ter o menino estado dois anos por bàtizar, isto é, ter estado «moiro». (...)

No uso quotidiano póde juntar-se um nome de ribeiro a um nome de pia, a modo de alcunha ou apelido, como: Antonio Bombiano, Emilio Cabeludo, (...) Julio Vai à cepa, Manuel Mostarda; ou juntar-se ao nome de pia ou de ribeiro o de um dos pais, ligados por de (Morena da Naséi, isto é, Morena filha da Naséi - Nazaré -; Aurora do Barrela, isto é, filha do Barrela). (...)"

(N.B. Foi respeitada a grafia original)

J. Leite de Vasconcellos, Antroponimia Portuguesa, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda/ Publidisa,  1ª edição 1928, 2ª edição facsimilada 2005, pp. 421-425.


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