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Escola Secundária José Saramago - Mafra

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

RECOMEÇO


Jola Wilk, London on Rainy Night 3.




Caminho sem saber bem onde os meus passos me levam. O ar é fresco, eletrizante, as nuvens negras e o piso molhado. No comboio não me apercebi de que havia chovido. Uma bicicleta passa por mim, mais uma, e outra: os donos de tal aparelho sorriem, não parecem importar-se com a roupa molhada.

A noite, tão escura, afigura-se-me iluminada. Podia renascer aqui. Este podia ser o local que tenho procurado.

Passo por um bar, parece estar cheio de homens e fumo, este tomado como oxigénio. Parece-me que Londres está cheia destas salas, feitas para agradar às barbas e aos bigodes que por lá passam.

Quando um me oferece uma bebida, recuso e continuo, mas mais apressada. Paro em frente a um motel. Este é de tijolo castanho e letras iluminadas, mas velhas: «Monstefield Motel» pode ser lido se nos esforçarmos para ignorar o «e» fundido. Entro, sendo rapidamente interpelada por uma senhora, nos seus oitenta anos. Ela é rígida nos seus movimentos, mas leve nas suas palavras. Este é o sítio. É aqui que fico. Mostro-lhe as joias douradas italianas que guardo na mala, ela não pergunta nada - o ouro também lhe dá jeito.

Já no quarto castanho, olho pela janela. Os candeeiros de rua fazem um pobre trabalho a iluminar a rua silenciosa. Olho em torno de mim, o meu quarto de princesa antigo parece-me muito melhor agora, que não o tenho. Este está equipado com uma cama com perfume a mofo, duas pequenas cómodas e um pequeno rádio. Ligo-o, e uma voz masculina grave enche o quarto, falando entusiasticamente do mais recente sabão a chegar ao mercado. Depois, uma melodia faz-se ouvir, juntamente com a voz de Doris Day.

Tudo à minha volta me parece pequeno, mas gigante. O futuro que desejava está agora fechado na cave. Mas esta cidade, este mundo com o qual nunca contactei, é enorme, chamativo. Algo de aliciante toca-me no esqueleto.

Esta cidade, este pequeno quarto castanho, são o meu recomeço. Aquilo que me ajudará a apagar por completo a antiga Maria.

Com sorte, nunca haverão de encontrar-me.

Francisca Fonte, Aluna do 12º LH4 desta Escola.



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