Imagens daqui.
“Nos
registos muçulmanos da época, as referências a Lisboa são escassas. Apesar de
pequena, seria uma cidade importante. O cartógrafo árabe Muhammad Al-Idrisi
(1110-1165) descreve-a como um lugar aprazível, protegido por um castelo e
rodeado por muralhas. Mas não tinha a supremacia sobre as restantes cidades
portuguesas, de que viria a usufruir depois da conquista pelos cristãos.
Olissipona
foi o nome que os romanos deram, em latim bárbaro, à cidade de Ulisses, ou Ulyssippo. Os
árabes «reconheceram» na partícula «ul»
o equivalente ao artigo definido “al” – Al-Lixbona, e não Lixpona, porque os
árabes têm dificuldade em articular a oclusiva «p», e o som que produzem é a oclusiva «b».
No tempo
dos muçulmanos, que, como povo, não eram predominantemente marítimos, o porto
de Alcácer do Sal teria sido rival de Lisboa. Edrisi refere em mais pormenor o
seu comércio e os seus estaleiros navais. Tinha as suas vantagens sobre Lisboa,
com a sua via aberta para o Alentejo, através do vale do Sado, enquanto o Tejo
era um obstáculo entre Lisboa e o sudeste.
A partir
dos inícios do séc. V, Lisboa viveu em clima de autarcia. A sua estrutura
urbana iria alterar-se, desativando-se os antigos espaços públicos romanos e
contraindo-se a população no interior das muralhas da cidade (…).
O domínio
muçulmano iniciar-se-ia em 714 e prolongar-se-ia por mais de quatrocentos anos
(até 1147). Não sendo uma metrópole de primeira grandeza na área do Andaluz
muçulmano, era, no entanto, uma cidade de considerável importância devido à sua
localização privilegiada e ao movimento portuário.
Descrita por
diversos geógrafos árabes, a cidade era cercada por uma cintura de muralhas que
envolvia as suas duas áreas fundamentais, também elas separadas por uma
muralha: a alcáçova, onde residia a elite administrativa, religiosa e militar,
a que hoje corresponde o Castelo de São Jorge, e a medina, que, pela encosta
meridional do Castelo, descia até ao rio Tejo, de maior pendor civil, comercial
e artesanal. No exterior das muralhas desenvolveram-se arrabaldes, de que os
mais importantes foram o oriental (zona de Alfama) e o ocidental (onde hoje se
situa a Baixa). (…)
Do lado
oriental a muralha da cidade descia para a Bab Ash-shams (Porta do Sol, que
ainda hoje se mantém na toponímia lisboeta), voltava à esquerda para a Bab
al-Hama (Porta de Alfama) e depois para o Chafariz del-rei, e para o sítio onde
foi construída mais tarde a Igreja da Misericórdia, subindo novamente para a
Porta do Ferro. (…)
No final
do tempo dos mouros, Lisboa servia sobretudo como porto de entrada e de saída
para os mercadores e fabricantes de Badajoz. Como muitos destes eram judeus,
isso causou o estabelecimento de agentes, seus correligionários, na cidade
portuária. Lisboa concorria assim com Alcácer do Sal. (…)
Os judeus
vieram para Lisboa relativamente tarde e não puderam instalar-se dentro da
cidade murada. Primeiro criaram um pequeno bairro entre os atuais Arco do
Rosário e o Largo de S. Rafael. A rua, que ainda hoje se chama da Judiaria,
ficava situada junto à muralha da cidade, mas, como o sítio da rua do Terreiro
do Trigo estava coberto, nessa altura, pelas águas do Tejo, quando a comuna já
não cabia no antigo bairro, teve que construir outro.
Como era
habitual, a comuna escolheu um sítio no extremo da área habitada, a ocidente da
cidade, no coração da presente Baixa, que manteve por muitas gerações e era
conhecida por «Judiaria Velha» ou «Judiaria Grande» (…)
O emaranhado
de ruas estreitas e curvas da judiaria velha desapareceu quando Lisboa foi
destruída pelo terramoto de 1755 e a parte baixa da cidade foi reconstruída.
Em numerosos
documentos da parte final da Idade Média figuram os nomes das ruas da judiaria,
denunciando especificamente as ocupações dos judeus de Lisboa nesses tempos
remotos.”
Inácio
Steinhardt, Raízes dos Judeus em Portugal
entre Godos e Sarracenos, Coleção Sefarad, Lisboa, Nova Vega, 2012, pp. 142-144.
Peço licença para fazer uma rectificação ao que escrevi no meu livro «Raizes dos Judeus em Portugal»
ResponderEliminarDepois de ler o meu livro, o meu amigo professor Herman Prins Salomon, que estudou o assunto do nome de Lisboa, esclareceu-me que afinal o nome Ulissipone para Lisboa é uma invencao latinista do Renascimento; nunca existiu tal nome antes do s. XVI.
O nome de Lisboa, segundo ele, vem do árabe Al-Isbona (assim o escreve tambem o Abravanel) e significa em arabe: O Porto.
Muito obrigada pelos esclarecimentos.
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