Soseki, Haiku
Imagem daqui.
“Quando uma vez lhe mostraram um epigrama de um verso e meio, Nicolas de Chamfort (1741-1794), ele próprio um mestre da mordacidade concisa, observou que o epigrama revelaria mais espírito se fosse mais breve. O epigrama, o aforismo, a máxima são o haiku do pensamento. Procuram concentrar o grau último da intuição penetrante no mais pequeno número de palavras possível. Quase por definição, e até mesmo quando se atém mais estritamente a uma prosa coloquial, o aforismo aproxima-se da condição da poesia. A sua economia formal visa surpreender num relâmpago incontestável; visa tornar-se singularmente memorável, à maneira do poema. Na realidade, as máximas ou apotegmas mais célebres caracterizam-se muitas vezes por uma modulação que se situa entre a grande poesia ou arte dramática e a natureza anónima do provérbio. Ficamos por um momento incapazes de recordar a origem pessoal exacta da máxima. (…) Em que texto encontramos o dito que contribuiu para desencadear toda uma revolução na história da percepção e das formas, segundo o qual «a natureza imita a arte»? As sóbrias iluminações de Shakespeare, Laurence Sterne e Oscar Wilde entraram em glória na linguagem corrente.
Na literatura francesa, os registos aforístico e epigramático desempenham um papel excepcional. (…)
Qual a razão da predilecção francesa pelo aforismo? (…) Uma das respostas referir-se-á a uma latinidade explícita e orgulhosa. A literatura e o pensamento franceses orgulham-se da sua afinidade com a fonte romana. Os usos romanos, nos domínios tanto do poder político como do discurso, atribuíam um valor eminente à sobriedade. A brevidade não formava somente a alma da inteligência; era também uma convenção masculina no campo do comando e do autocomando, a manter mesmo sob a pressão extrema do maior risco particular ou cívico. (…) É da sua herança latina que a própria língua francesa toma o seu ideal de la litote [litotes]. Understatement [eufemismo] é uma tradução coxa. Uma litotes, como a encontramos persistentemente no maior dos escritores franceses – Racine -, é a expressão cerrada e densamente concentrada de uma imensidão essencial, ou por vezes grandeza, reconhecida no ser humano e nas suas emoções. É, no seu núcleo mais peculiar, essa irrupção de silêncio que os pilotos dizem registar-se no centro do furacão.”
George Steiner, George Steiner em The New Yorker, org. de Robert Boyers, Lisboa, Gradiva, 2010, pp. 309-311.
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