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Escola Secundária José Saramago - Mafra

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

DESCRIÇÃO SUMÁRIA DE LISBOA (1723-1726)

Vista do Tejo e de uma parte do Terreiro do Paço, antes de 1755
Estampa de Maillet (Paris, 1760)

“Portugal de norte a sul não tem mais que cem léguas e da costa à fronteira não mede mais de trinta e cinco; a Corte, porém, em dias de gala, é tão grande como se o país fosse vastíssimo. O rei compraz-se em vestir esplendidamente e o melhor meio para lhe cair em graça e ter acesso à sua pessoa é, quem tal pretenda, apresentar-se ricamente vestido.
Os grandes do reino residem habitualmente em Lisboa e as equipagens e palácios que possuem são magníficos, o que contribui muito para o embelezamento da cidade que está sendo muito frequentada por forasteiros provindos de todas as nações da Europa, atraídos pela curiosidade e particularmente por interesses mercantis. Embora em cada casa fidalga existam mais de cem criados, incluindo negros e moleques, a despesa com esta criadagem é módica pois não vai além do que custa uma ração de arroz, diariamente. (…)
O edifício da Alfândega não tem beleza mas está bem situado, à margem do Tejo. Conseguir qualquer despacho nesta Alfândega é o cabo dos trabalhos, tantas têm de ser as assinaturas no mesmo documento com que se hão-de retirar as mercadorias. Oferece-se ali, porém, uma vantagem aos comerciantes, a de lhes ser permitido armazenar ali mercadorias e de as irem retirando à medida das necessidades, sem mais qualquer encargo. A maior parte dos comerciantes não retiram os géneros sem os terem vendidos e facturados aos seus fregueses. A Alfândega dá ao rei o seu melhor rendimento na Europa.
O mercado designado por Ribeira não fica distante da Alfândega. Vende-se ali de tudo, peixe, caça, galináceos, hortaliças, tudo, enfim, o que é necessário à vida. O mercado de peixe de Lisboa é, sem possível contestação, o melhor da Europa pela variedade de peixe que ali se encontra. O Terreiro do Trigo fica-lhe nas imediações e ali se vendem as várias qualidades de cereal. (…)
É coisa de admirar que na cidade de Lisboa apareça água por toda a parte, seja no alto das colinas, seja a meia encosta ou ainda na parte baixa. Acontece contudo, frequentemente, que uma vasta casa que possui um bom poço se encontre de um dia para o outro sem água em virtude de algum vizinho ter aberto, em plano inferior, um outro poço. Se isto acontece na casa de um grande senhor que possua equipagem, a casa pode dizer-se que perdeu todo o valor por causa da despesa a que nestas condições obriga a obtenção da água para saciar as mulas e os cavalos. (…)
A água de Lisboa não é má e as cozinhas do rei estão bem providas dela, possuindo torneiras donde emana com abundância. Os portugueses bebem em púcaros de barro de Estremoz. Este barro é vermelho, muito leve e cheira a terebentina. Os portugueses encontram-lhe um gosto delicioso."(…)
Charles Frédéric de Merveilleux, “Memórias Instrutivas sobre Portugal, 1723-1726”, in O Portugal de D. João V visto por três forasteiros, tradução, prefácio e notas de Castelo Branco Chaves, Lisboa, Presidência do Conselho de Ministros – Secretaria de Estado da Cultura, Série Portugal e os Estrangeiros, Biblioteca Nacional, 2ª edição, 1989, pp. 215-216.

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