Soror Mariana Alcoforado, Matisse (1946)
Imagem daqui.
“5-
Da supervivência do Amor (Dom Pedro e Dona Inês)
Supervivência tanto significa
intensidade, vivência superlativa, como superação da morte, vida perene.
Um mito de fatalidade amorosa,
que é céltico, foi renovado, em termos trans-sociais e transcendentes, por dois
amantes, um príncipe de Portugal e uma fidalga da Galiza. Sequência trágica, a
dos amores entre altos personagens de uma e de outra banda do Minho (Rainha
Dona Tareja – Fernão Pérez de Trava; Príncipe Dom Pedro – Dona Inês de Castro;
Rainha Dona Leonor de Telles – Conde de Andeiro).
Sobremaneira fatal, irregular
e trágico foi este. O príncipe, uma vez rei, desenterrou o corpo da amada,
reabilitou loucamente, pomposamente, o seu amor, entronizando rainha de
Portugal, com as devidas honras aquela que seu coração elegera e lhe ficara
impressa para sempre no pensamento e na carne.
E nos túmulos de pedra
lavrada, ao Juízo Final se entrega o mais fervoroso, o mais louco arrebatamento
de todos os tempos.
A história e lenda de Inês de
Castro exprime a importância absorvente que tem o amor na existência do nosso
povo. Segundo D. Francisco Manuel de Melo, era notória a índole amorosa do
português, e Jorge Ferreira de Vasconcelos faz dizer a uma personagem da Eufrosina
que o amor é português. A poesia de amor na língua pátria é copiosa e
inconfundível. Também a prosa está enxameada com documentos dessa inebriante
absorção.
As expressões mais altas,
mais típicas do amor português estão em D. Diniz, Camões, Bernardim, Cristóvão
Falcão, Tomaz Gonzaga, Florbela, Pascoaes (elegia do amor), etc….
Tem valor para o caso a fala
do Cardeal na Ceia de Júlio Dantas.
As cartas de Soror Mariana, a
despeito das ressalvas que se lhes faça quanto à autoria, constituem dos
testemunhos mais impressionantes do amor português.
O nosso romantismo é de raiz:
por isso precede séculos o chamado movimento romântico, excedendo-o até aos
nossos dias, tanto em Portugal como no Brasil.
O lema camoniano
da linda Inês a cada passo renasce em nossa literatura, feito motivo
perene.”
Publicado
em O que é o Ideal Português, Lisboa, Edições Tempo, 1962
F. Cunha
Leão, Do Homem Português, Lisboa, Guimarães Editores, 2007, p. 89.
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