A Vida de Pi, filme realizado por Ang Lee (2012)
Imagem daqui.
“CAPÍTULO 7
Foi para
mim uma sorte ter tido alguns bons professores na juventude, homens e mulheres
que entraram na minha cabeça obscura e acenderam um fósforo. Um deles foi o Sr.
Satish Kumar, o meu professor de biologia no Petit Séminaire e um comunista activo
que estava sempre à espera que Tamil Nadu deixasse de eleger estrelas de cinema
e seguisse o exemplo de Kerala. (…)
O Sr.
Kumar foi o primeiro ateu confesso que eu conheci. Descobri isso não na aula,
mas no jardim zoológico. Ele era um visitante regular que lia integralmente as
tabuletas e as notas descritivas (…). Cada [animal] era para ele um triunfo da
lógica e da mecânica, e a natureza como um todo era uma ilustração
excepcionalmente perfeita da ciência. Aos seus ouvidos, quando um animal sentia
o impulso para acasalar estava a dizer «Gregor Mendel», lembrando o pai da
genética, e quando era tempo de mostrar o seu temperamento, dizia «Charles
Darwin», o pai da selecção natural, e aquilo que nós considerávamos balidos,
roncos, silvos, resfôlegos, rugidos, uivos, gorjeios e ganidos eram apenas
sotaques, indistintos para os estranhos. Quando o Sr. Kumar visitava o zoo, era
para tomar o pulso ao universo, e o seu espírito estetoscópico confirmava-lhe
sempre que tudo estava em ordem, que tudo era ordem. Saía do zoo sentindo-se
cientificamente revigorado.(…)”
Yann Martel, A Vida de Pi, Lisboa, Difel, 2003, pp. 42-43
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